Poucas imagens são tão icônicas para o cinema como King Kong pendurado no topo do Empire State Building, na Nova York dos anos 30. Entretanto, o novo filme sobre o Rei dos Macacos foge exatamente desse conceito, ao se passar na casa do gigante, ser ambientado durante a guerra do Vietnã e garantir um tom ainda mais fantasioso à conhecida história.
A Ilha Caveira é capaz de fazer de Kong um deus com sua própria mitologia, algo que nenhum dos filmes anteriores realmente fez. Para os nativos, o macaco é o protetor máximo contra outras criaturas perigosas do local. Último de sua espécie, ele passa seus dias lutando contra várias ameaças e vagando sem rumo pela ilha, protegendo seus súditos e o mundo de ameaças inimagináveis.
É um conceito interessante e quando o filme se afasta dos clichês básicos da história do gorila ganha força e credibilidade. Além disso, logo fica clara a relação com o filme de Godzilla, afinal a agência Monarch, mesma do filme de 2014, está por trás da exploração da ilha, sem revelar a ninguém seus reais objetivos: encontrar organismos gigantescos que são ameaças para a humanidade.
O grupo de exploradores é comandando pelos membros da Monarch Bill Randa (John Goodman) e Houston Brooks (Corey Hawkins), que convencem o governo a financiar uma expedição à ilha recentemente descoberta por satélites. Eles são acompanhados por militares retirados da guerra do Vietnã (liderados pelo Coronel Packard vivido por Samuel L. Jackson), outros cientistas, uma fotógrafa anti-guerra (Brie Larson) e um rastreador britânico (Tom Hiddleston).
O ponto alto são os combates, muito bem coreografados e ágeis, tudo fica ainda mais divertido quando o filme tenta trazer o clima de clássicos da Guerra de Vietnã como Apocalypse Now na luta contra os seres da ilha. A cena dos helicópteros em formação sobrevoando a selva ao som de Paranoid, de Black Sabbath, é de arrepiar. Entretanto, o roteiro é direto, não perde tempo apresentando personagens e é construído de forma a cada situação simplesmente levar a outro encontro, outra luta até chegar ao óbvio clímax. É a fórmula básica do cinema de ação de Hollywood em seu auge.
Visualmente o filme é inspirado. Os efeitos em computação gráfica são muito bem feitos, a Ilha da Caveira é misteriosa e variada, como deve ser, e as criaturas são realistas e cumprem seu papel no ecossistema local: algumas são aterradoras, outras simplesmente se defendem de ataques e outras são claramente inofensivas, apesar do tamanho. Mérito do diretor e dos técnicos de efeitos conseguirem fazer Kong alternar esses estereótipos com simples atitudes e olhares. A trilha sonora dos anos 70 ainda serve como bônus.
O filme, eventualmente, perde força, abusa dos clichês, inclusive elementos batidos da história de Kong como sua obsessão por mulheres loiras, e abre mão até mesmo da estética inspirada de seu início. Conforme avança em direção ao final, fica cada vez mais previsível e genérico. Sem contar com grandes desenvolvimentos de personagens ou questões emocionais, o longa depende apenas de sua criatividade visual, quando isso também fica de lado, o filme se perde.
No quesito atuações, o forte elenco mantém o padrão esperado. Nada incrível, mas convincente. Destaque positivo para Shea Whigham, ótimo como um dos soldados que não parece se espantar com mais nada. E para John C. Reilly, que rouba a cena sempre que está presente. Os coadjuvantes, em geral, brilham mais do que os protagonistas e isso é curioso. Já Samuel L. Jackson é o destaque negativo, ao tentar incorporar o personagem de Marlon Brando em Apocalipse Now de forma caricata e sem apelo real.
Kong: A Ilha Caveira é um filme divertido, com boas sacadas e confiante em sua própria mitologia, mas que não é capaz de manter a criatividade até o final. Não é um filme padrão do Rei dos Gorilas e seus melhores momentos acontecem quando se afasta dos clichês, mas a necessidade de justificar uma possível luta contra Godzilla num filme futuro faz a trama tomar atalhos e decisões sem muito sentido, que comprometem a qualidade. No final das contas, é um bom filme de monstros gigantes, mas seu potencial desperdiçado acaba deixando um gosto amargo na boca ao fim da sessão.
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